A aplicação em fundos imobiliários vem crescendo nos últimos anos, mas assim como o investimento em ações, os cotistas devem analisar os riscos dos ativos e dos locatários dos imóveis em carteira.
O caso do fundo imobiliário Hospital Nossa Senhora de Lourdes, que pagou o aluguel do mês passado com 22 dias de atraso e está renegociando o valor da locação, mostra os riscos envolvidos em se aplicar em fundo imobiliário de um único inquilino.
Lançado em março de 2006, o portfólio tem como único ativo o prédio alugado para o hospital localizado na Rua Perobas, no bairro do Jabaquara em São Paulo.
A concentração da carteira em apenas um empreendimento ou único inquilino era muito comum nos primeiros lançamentos de fundos imobiliários. Mas isso tem mudado e hoje os gestores têm buscado diversificar o risco da carteira, pulverizando os investimentos em vários imóveis.
Primeiro fundo imobiliário lançado no Brasil em 1996, o Memorial Office, administrado pela Coinvalores tinha como único locatário a empresa de call center do grupo Telefónica, a Atento.
Em 2010, no entanto, a Atento iniciou a migração das operações para uma nova sede, devolvendo oito dos 25 andares do edifício, localizado na Avenida Júlio Gonzales, 132, no bairro Barra Funda, em São Paulo. “Em um primeiro momento houve impacto na receita do fundo, mas já conseguimos relocar os andares vagos para novos inquilinos”, afirma Fernando Silva Telles, sócio- diretor da Coinvalores.
A carteira do Memorial Office acumula no ano queda de 5,42%, até novembro, segundo a consultoria Fundo Imobiliário, que considera o retorno com a distribuição de rendimentos e a variação do valor da cota na bolsa. “A rentabilidade do fundo chegou a cair cerca de 30% nos últimos três meses, mas deve retornar à normalidade a partir de dezembro”, diz Telles. No mês passado, o retorno sobre a cota com rendimentos distribuídos foi de 0,67%, enquanto que a média que o fundo pagava era de 0,78%.
Os andares vagos pela Atento foram locados por quatro inquilinos, com preços reajustados, e com isso, a Coinvalores conseguiu diversificar o risco da carteira. “Estamos com fila de espera de empresas interessadas em novas vagas no edifício”, diz Telles.
A grande demanda na região se deve ao baixo valor da locação, em torno de R$ 60 a R$ 80 o metro quadrado, comparado com o cobrado nos arredores das avenidas Faria Lima e Engenheiro Luís Carlos Berrini, área considerada nobre e de grande concentração de escritórios na cidade de São Paulo, onde o valor da locação chega a R$ 180.
A ampliação do portfólio, além de diversificar os riscos, tem mostrado um impacto positivo para a rentabilidade das carteiras imobiliárias. O fundo Rio Bravo Corporativo, por exemplo, apresentou uma valorização de 35% das cotas desde 2010 e acumulava ganho de 10% com a distribuição de rendimentos nos últimos 12 meses.
O portfólio, que tinha na carteira oito andares do edifício JK Financial Center, hoje conta com mais duas lajes corporativas, uma no Jatobá Green Building, alugada para a Kraft, e outra no Pátio Paulista locada para a Swiss Re, todos localizados na cidade de São Paulo. Com os recursos captados na quarta emissão, que está em andamento, o fundo deve adquirir novas lajes corporativas em seis a oito edifícios.
O risco de fundos com um único inquilino depende, no entanto, da modalidade dos investimentos e que tipo de garantias são oferecidas para mitigar eventuais problemas.
Em primeiro lugar é preciso avaliar o risco de crédito do locatário, qual o ramo de atividade da empresa e seu relacionamento com o mercado.
Há casos que os contratos são de longo prazo fechados com inquilinos com baixo risco de crédito como o da Torre Almirante, que tem na carteira um edifício alugado para a Petrobras. O fundo apresentava ganho de 11,48% no ano, até novembro. “O risco do aluguel para um inquilino como a Petrobras, apesar de concentrado, é bem menor que do alugar escritórios para 20 empresas pequenas”, afirma Vitor Bidetti, diretor da Brazilian Mortgages (BM), responsável pela administração do fundo.
Outra questão é a modalidade do investimento. Imóveis que são construídos sob medida para uma empresa (“built to suit”), geralmente envolvem contratos atípicos de locação de longo prazo, de no mínimo 20 anos.
Esses contratos não estão sujeitos à lei do inquilinato, que prevê uma multa equivalente a três meses de aluguel, proporcionais ao tempo restante do contrato, em caso de inadimplência.
No caso dos investimentos imobiliários na modalidade “built to suit”, a saída do locatário implica no pagamento de uma indenização no valor equivalente ao prazo remanescente do contrato de locação. Se uma empresa encerra antecipadamente, por exemplo, um contrato de 20 anos, restando 10 anos para o vencimento, ela terá que pagar o valor integral do período remanescente.
O fundo imobiliário Campus Faria Lima, por exemplo, foi estruturado pela BM para o Insper e envolve um contrato de aluguel com prazo de 20 anos.
Outras estruturas do fundo podem mitigar os riscos no caso de inadimplência como a cessão fiduciária de recebíveis.
O fundo imobiliário Hospital Nossa Senhora de Lourdes, administrado pela Brazilian Mortgages, por exemplo, conta com uma estrutura de garantia para o caso de inadimplência, que consiste na cessão fiduciária de recebíveis equivalente ao valor de dois aluguéis, decorrentes do pagamento dos planos de saúde ao hospital, que devem permanecer depositados em uma conta vinculada em nome do fundo para movimentação exclusiva em caso de atraso do pagamento.
Parte do aluguel pago com atraso referente ao mês passado veio dessa cessão fiduciária, e o restante foi depositado pelo próprio hospital. “A cessão fiduciária é uma garantia de pagamento importante para mitigar o risco para os cotistas”, afirma Rodrigo Machado, sócio-diretor, responsável pela área de fundos imobiliários na XP Investimentos.
Ele lembra que o risco de se investir em fundos imobiliários que têm na carteira imóveis alugados para hospitais e universidades é maior do que o de carteiras com foco em escritórios comerciais, mas costumam pagar uma remuneração maior em função do risco.
A oferta do fundo Hospital Nossa Senhora de Lourdes, por exemplo, saiu com um prêmio comparado com a do Torre Almirante. “Escritórios comerciais são mais fáceis de alugar do que o prédio ocupado por um hospital ou faculdade”, diz Machado.
Fonte: Valor