Você conduz a sua vida profissional e pessoal como planejou – se é que planejou – ou está deixando na mão de outros o poder de decisão? No que diz respeito a escolhas profissionais e desenvolvimento da carreira, saber quem você é, onde está, o que fazer e aonde ir ainda é fundamental.

Com as mudanças nos vínculos de trabalho e a quebra na relação paternalista entre empresa e funcionário, uma carreira bem-sucedida é hoje resultado de autoconhecimento, percepção de contexto, muita capacidade de aprender e de “entregar”.

Antes de tudo, você deve entender as suas reais motivações, ou seja, o que faz seus olhos brilharem. Uma pergunta que muitos executivos me fazem e dizem fazer a si mesmos é: como faço e o que faço?

Você pode começar com uma revisão, que deve ser periódica, de sua autobiografia profissional. Analise, por exemplo, os principais projetos em que esteve envolvido e qual foi seu grau de participação neles. E mais: pergunte-se até que ponto os resultados lhe trouxeram satisfação.

É essencial, nesse processo, determinar os motivadores de carreira, ou seja, o conjunto de competências e valores que o distinguem dos outros, estabelecem as suas escolhas e influenciam fortemente o seu desempenho. Uma boa dica para descobri-los é pensar naquelas coisas das quais você não abriria mão de forma alguma, pois se o fizesse se tornaria infeliz. Edgard Schein denomina esses motivadores de “âncoras de carreira”. São elas: “estilo de vida”, que coloca a qualidade de vida como ponto fulcral; “independência”, que é muito frequente em profissionais autônomos; “desafio puro”, que move aqueles que rapidamente se sentem enfastiados com a perspectiva de estabelecer uma rotina; “segurança e estabilidade”, típicas dos profissionais que buscam concursos públicos; “competência técnica e funcional”, própria daqueles que optam por carreira em Y; “criatividade empresarial”, comum entre os empreendedores; “competência administrativa geral”, usual nos presidentes; e “dedicação a uma causa”, antes muito comum nos trabalhos comunitários e agora cada vez mais frequente no ambiente empresarial.

O próximo passo é relembrar quais foram os principais desafios que você enfrentou e cujos resultados lhe trouxeram orgulho e lhe fizeram crescer. Considere todas as áreas da sua vida: a profissional, a familiar, a afetiva, a social e a espiritual. Leve em conta tanto os sucessos como os fracassos e quanto aprendeu com eles. Afinal, saber lidar com experiências difíceis é um fator determinante em uma carreira bem-sucedida.

A competência em saber identificar os seus ciclos profissionais, o momento de concluí-los e construir novos desafios é também fundamental e um processo cada vez mais difícil em um ambiente que não deixa “tempo” para encerrar adequadamente cada etapa.

Em uma de nossas recentes pesquisas, constatamos que a sobreposição de funções, os movimentos horizontais de carreira, as reestruturações e as promoções intensificaram o ziguezague dos executivos. Resultado: entre 2000 e 2009, eles mudaram de cargo 6,1 vezes – ou seja, ficaram, em média, menos de dois anos em cada função. Será que esse curto intervalo de tempo é suficiente para completar ciclos estratégicos?

Para não perder o timing, convém fazer uma análise periódica sobre o seu poder decisório. Não se trata da sua posição hierárquica, mas do seu raio de influência nos projetos, nas equipes ou nas áreas em que atua. Verifique se esse poder está aumentando, diminuindo ou está congelado – e quanto a empresa reconhece o seu papel. Quando um ciclo chega ao fim e o profissional não toma a iniciativa de encerrá-lo e construir outro, ele acaba “perdendo valor”.

Se perceber que é hora de encarar mudanças, adote uma postura de “espera ativa”. Isto é, mantenha o seu projeto de carreira em pleno andamento, mas não fique preso ao roteiro. É preciso disciplina para permanecer na estrada, mas, diante de alguma oportunidade que justifique um desvio, tenha flexibilidade para rever seu planejamento.

O processo de construção da carreira envolve ainda uma saudável reflexão sobre o equilíbrio entre todas as suas “carreiras”. Como constatamos em nossas pesquisas, o executivo que é infeliz na vida pessoal pode cair em uma cilada: a dedicação excessiva ao trabalho. Apesar de obter um reconhecimento rápido, indivíduos que têm sua âncora de prazer apenas na profissão apresentam mais dificuldade de vislumbrar outros horizontes e acabam diminuindo a possibilidade de movimentos mais amplos na carreira.

Vale ainda uma reflexão sobre os relacionamentos fora do seu círculo de trabalho. Esses contatos podem ajudá-lo a ampliar sua visão de mundo, a entender outras perspectivas de vida e até a redimensionar seus problemas. Podem ser também preciosos quando você decidir começar outro ciclo na carreira. E o mais importante: eles ajudam a diminuir a sensação de que você não tem alternativa.

Um último lembrete: tenha sempre em mente que a responsabilidade de permanecer em uma organização que o faz se sentir infeliz é sua, e não da empresa. Por isso, vale a pena, de tempos em tempos, voltar àquele nosso questionamento inicial: “Estou conduzindo minha vida profissional ou deixei na mão de outros o poder de decidi-la?”

Sempre é tempo de assumir a condução do próprio destino.

Betania Tanure doutora, professora da PUC Minas e consultora

Fonte: Valor

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