Eu tenho ouvido alguns comentários sobre investir para longo prazo em juros reais. O que isso quer dizer? Quais são as aplicações disponíveis? C.R.
Gisele Colombo de Andrade, CFP : Durante anos (décadas talvez), os brasileiros conviveram com taxas de juros nominais altíssimas, ora por conta dos “gatilhos” – acionados para tentar corrigir os preços nos períodos de inflação -, ora para possibilitar o financiamento das contas públicas. Isso num país muito menos confiável do que o Brasil de hoje, quando se exigia um prêmio (rendimento extra) para a compra de títulos públicos.
Há quinze anos nossa história econômica vem possibilitando uma consistente redução nos patamares de juros nominais, ao mesmo tempo em que passamos a conviver com índices de inflação bastante baixos para nossos padrões.
Somente agora nos damos conta da necessidade de investir para obter uma renda real, ou seja, uma vez descontada a inflação no resultado das aplicações, ainda sobre uma remuneração positiva. Aliás, sendo um pouco mais exigentes, devemos descontar dos rendimentos nominais, além da inflação, também o imposto de renda.
Nos períodos em que houve a necessidade de estimular o crescimento ou recuperação da economia, vimos o Banco Central reduzir a taxa de juros para patamares inferiores a 10% ao ano. Então, começamos a questionar se ainda valia a pena investir em juros ou, como mais comumente falamos, em produtos com remuneração atrelada ao CDI.
Há no mercado diversas opções oferecendo remuneração indexada a índices de inflação, ora IGP-M, ora IPCA. Quando nos referimos a CDBs e títulos públicos, normalmente recebemos a cotação no índice escolhido, acrescido de uma taxa de juros. Por exemplo, IPCA mais 5,80% ao ano Atualmente o mercado financeiro também dispõe de fundos de investimento, os quais investem em papéis atrelados a índices de inflação, além dos títulos que mencionamos acima.
O que isso significa na prática? Quer dizer que o seu dinheiro terá como rentabilidade toda a variação do indexador escolhido (no nosso exemplo, IPCA), e ainda a taxa de juros de 5,80% ao ano. Portanto, se você tem esse índice como uma boa referência de longo prazo para manter o seu poder de compra, você está recebendo “juros reais” de 5,80% ao ano, antes de pagar o imposto de renda.
Talvez o IPCA não seja o seu indexador preferido, afinal, sua referência pode ser o IGP-M ou mesmo a paridade com outra moeda (dólar ou euro, só para ensaiarmos outras possibilidades).
O importante, quando escolhemos esse tipo de correção para nossos investimentos, é reconhecer que estamos deixando de lado o “padrão CDI”, que vem norteando a maior parte dos investidores por muito tempo.
Como o CDI se relaciona à taxa praticada pelo Banco Central para a economia, em alguns momentos pode haver uma distância bem perceptível entre os resultados de investimentos nessa modalidade e aqueles negociados com outros indexadores, principalmente os índices inflacionários.
No curto prazo, isso ocorre porque os ajustes de taxa são implementados pelo Banco Central de forma gradativa, visando ao controle da inflação e do aquecimento (ou não) da atividade econômica, deixando os juros (e consequentemente o CDI), um pouco “atrasados” com relação aos índices de preços.
Entretanto, nas observações de longo prazo, o CDI tende a alcançar o desempenho dos investimentos atrelados aos índices de preços, já que a taxa de juros proposta pelo Banco Central busca o equilíbrio da economia.
O que pode provocar impactos nessa convergência de longo prazo são aspectos menos técnicos. Supondo a existência de um Banco Central leniente ou sem independência, haveria o risco de as taxas de mercado não estarem adequadas a uma realidade econômica.
Por conta desses riscos, é que voltamos à velha máxima de diversificar sua alocação, parte nos tradicionais produtos remunerados pelo CDI e outra parte em outros, que buscam uma parcela em juros reais. Nenhum radicalismo é saudável…
Gisele Colombo de Andrade é Planejadora Financeira Pessoal e possui a Certificação CFP (Certified Financial Planner) concedida pelo Instituto Brasileiro de Certificação de Profissionais Financeiros (IBCPF) E-mail: giselecolandrade@hot mail.com
Fonte: Valor