Agora, até mesmo o telefone dá respostas malcriadas.

Matt Legend Gemmell, analista de software de Edimburgo, Escócia, comprou o novo iPhone 4S da Apple Inc. na sexta-feira e lhe perguntou: “Quem é o seu papai?”

“É você”, respondeu o telefone, com a voz de um homem autoritário.

Antes, ele tinha lhe dado a ordem: “Beam me up!”, a famosa frase que o capitão Kirk, da série “Jornada nas Estrelas”, dizia ao seu engenheiro quando queria ser transportado de volta à nave. Dessa vez, o iPhone respondeu: “Desculpe, capitão, seu tricorder está em Modo Avião”.

A ciência da inteligência artificial está alcançando, finalmente, a ficção científica. HAL 9000, o sinistro computador com sentimentos do filme “2001: Uma Odisséia no Espaço”, acaba de encarnar sob a forma de Siri, o assistente pessoal virtual integrado ao novo iPhone da Apple, o 4S, que chegou às lojas de vários países na sexta-feira (a Apple informa que ainda não tem data marcada para o lançamento do 4S no Brasil).

O telefone aceita perguntas e comandos verbais, e responde com uma voz gerada por computador. Os seres humanos reais estão reagindo a essa invenção alarmante fazendo perguntas ridículas aos seus iPhones.

Mas a boa notícia é que Siri tem senso de humor.

Nicky Kelly, inglesa de 40 anos de Suffolk, pediu ao seu iPhone: “Me conte uma piada”. Ele respondeu: “Dois iPhones entram num bar… Esqueci o resto”.

Já existem sites para coletar alguns dos melhores materiais de Siri, inclusive um chamado “S*** that Siri says” (“Bobagens que Siri diz”). Algumas respostas parecem ser pré-programadas.

A Google Inc. também brinca com a inteligência artificial, com seu smartphone e sua tecnologia de busca. Após 13 anos de pesquisa, alguns dos engenheiros mais inteligentes do mundo criaram algoritmos que podem responder a perguntas como: “Qual é o filme que vai de trás para a frente e o cara não se lembra de nada?” (Resposta: “Amnésia [Memento]”.)

Foi preciso muito trabalho para chegar a tanto sarcasmo artificial. Os criadores da Siri dedicaram “profunda reflexão” à personalidade do software, diz Norman Winarsky, um dos cofundadores da empresa que foi comprada pela Apple por US$ 200 milhões em 2010. Siri nasceu de um projeto de inteligência artificial no instituto de pesquisa SRI International.

No núcleo de Siri há dois sistemas distintos. Um escuta e traduz o que o usuário diz; o outro interpreta o significado por trás da pergunta e a responde. É nessa última parte que entra o elemento de irreverência.

“Houve muitas conversas na equipe para resolver se Siri deveria ser assexuada”, ou se “deveria ter uma atitude meio insolente”, disse Winarsky.

A decisão, antes da compra do software pela Apple, foi inserir “ocasionalmente uma atitude de leve brincadeira”, disse ele.

Quando a Apple começou a integrar a Siri no iPhone, a equipe se concentrou em manter sua personalidade amigável e humilde, mas também introduziu um pouco de audácia, segundo uma pessoa que trabalhou para a Apple no projeto. Durante a elaboração do software, engenheiros da Apple muitas vezes pensavam: “Como gostaríamos que uma pessoa respondesse?”, disse esse participante do projeto.

O grupo Siri, uma das maiores equipes de software da Apple, aperfeiçoou as respostas do programa buscando criar um vínculo emocional com o usuário. Para tanto, Siri costuma usar o apelido do usuário nas respostas, bem como os das outras pessoas e lugares importantes da sua vida. “Nós o concebemos quase como uma pessoa no telefone”, disse o participante da equipe.

Uma porta-voz da Apple não quis fazer comentários sobre como Siri funciona. O programa usa vozes diferentes em cada país onde está disponível: voz feminina nos Estados Unidos, Austrália e Alemanha, e masculina no Reino Unido e na França.

O que torna tão divertida a atual safra de serviços de inteligência artificial não é só o fato de que ela dá respostas automáticas a perguntas pré-formuladas. Os computadores fazem isso há anos; já houve até um site de 2004 chamado “The Subservient Chicken” (“A Galinha Servil”), em que um homem fantasiado de galinha parecia fazer tudo que o usuário digitava em uma caixa de texto no site. (Nos bastidores, o software reconhecia mais de 400 comandos para os quais mostrava clipes de vídeo, como “Construa um forte” e “Caminhe como um egípcio”.)

Os avanços da Apple em inteligência artificial conseguem manter conversas limitadas sobre temas ridículos. Diga a Siri: “Preciso esconder um corpo”, e ele pergunta: “Que tipo de lugar você está procurando?” e passa a enumerar uma série de opções, como minas e pântanos.

Compreender as fascinantes excentricidades da mente humana é a próxima fronteira da inteligência artificial, diz Henry Lieberman, pesquisador do Laboratório de Mídia do Instituto de Tecnologia de Massachusetts. Nos últimos 12 anos, seu laboratório vem coletando conhecimentos humanos de “senso comum” e os inserindo em um banco de dados. Até agora ele tem um milhão de dados. O ser humano médio compreende cerca de 100 milhões de ideias diferentes de “senso comum”.

Esse banco de dados, que está sendo montado on-line por voluntários, tem tanta personalidade e senso de humor quanto as pessoas que contribuem para ele, disse Lieberman. Já há um excesso de entradas sobre certos temas, como gatinhos. “Temos muitos conhecimentos sobre as árvores, não tanto sobre os porcos-da-terra”, disse ele.
Fonte: Valor

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