Uma série de precauções na hora de se utilizar de tais serviços evitam problemas para a contabilidade do condomínio
Ao contratar o serviço de um autônomo, o síndico deve ter os mesmos cuidados que tem quando contrata uma empresa. Isso porque é comum as relações com o autônomo serem mais pessoais, o que leva a descuidos, como o de não pedir os documentos necessários, não negociar o preço pelo serviço incluindo o valor da retenção, ou não respeitar regras que evitam a caracterização do vínculo empregatício.
O autônomo, prestador de serviço, é pessoa física que presta serviços em caráter eventual, por sua própria conta e risco, para o condomínio. Porém, como segurado obrigatório da Previdência Social, enquadrado na categoria contribuinte individual, deve proceder a sua inscrição no Regime Geral de Previdência Social (RGPS). Com esta inscrição, todo o serviço que prestar obriga a uma retenção de 11% ao INSS pelo tomador do serviço.
A obrigação não é tão recente, mas ainda há quem tenha dificuldades para lidar com esta demanda. Mesmo quem conta com a ajuda de uma administradora deixa de cumprir com cuidados simples que podem garantir maior segurança fiscal e jurídica para o condomínio.
CPF e PIS do autônomo – Para começar, é fundamental documentar todo o processo.
“O síndico deve pedir os documentos necessários ao prestador do serviço, pois só com o número de inscrição do CPF e PIS poderá efetuar o recolhimento, do valor retido, à Previdência Social. O pagamento pelo serviço deverá ser feito mediante a apresentação de recibo, onde constarão todos os dados sobre o serviço prestado, como tipo de serviço, valor cobrado e número dos documentos do autônomo. Depois, as guias pagas e cópias dos recibos devem ser arquivadas para comprovação futura, sempre que necessário”, orienta o contador Paulo César Martins Fernandes, que há nove anos está à frente do departamento de contabilidade de uma grande administradora do Rio de Janeiro.
Atenção ao negociar preço – É preciso certificar-se de que o autônomo tem conhecimento de que será descontado em 11%. “Com frequência recebemos reclamações de prestadores de serviços, que ao chegarem ao nosso escritório para receber, por exemplo, R$ 1.000,00 brutos, recebem R$ 890,00 (1.000,00 – 11%). Nossa orientação é para que ao contratar um autônomo já informem sobre a retenção, que é obrigatória”, explica. Ele sugere que se for o caso de uma contratação cujo valor líquido combinado seja de R$ 1.000,00, deverá ser feito o seguinte cálculo: R$ 1.000,00 / 0,89 = R$ 1.123,60. “Assim, sendo o recibo o valor de R$ 1.123,60, brutos, restará líquido (deduzida a retenção de 11%) a pagar os mesmos mil reais pedidos pelo autônomo pela execução do serviço”, completa.
Teto de recolhimento e IR – É preciso checar com o prestador de serviço se já sofreu retenções, em outros serviços prestados por ele no mês corrente, que superem o valor de R$ 457,49, que é o limite mensal de retenção para o INSS. Assim, se o prestador comprovar que já sofreu retenções no valor acima citado, não caberá retenção. Lembrando que apesar de, neste caso, não haver retenção, o condomínio continua obrigado a recolher a parte, chamada patronal, de 20% sobre o valor total do serviço. “É papel do prestador apresentar comprovação das retenções sofridas no mês”, diz.
O especialista alerta ainda para outra informação importante sobre a qual os condomínios costumam fazer confusão. “Condomínio tem CNPJ, mas não tem natureza jurídica”, diz. Por isto, não está obrigado a reter o Imposto de Renda sobre autônomo. “Sem esta informação, por vezes, vemos condomínios fazerem a retenção, quando a legislação não exige tal medida. É mais uma guia, mais um lançamento, mais trabalho desnecessário”, completa.
Patronal: mais 20% – O condomínio deverá recolher, além do valor retido, também a contribuição patronal de 20%. Ou seja, recolherá 31% do valor total combinado pelo serviço.
“Aqui cabe acrescentar que, se a prestação for feita por um microempreendedor individual, o chamado MEI, a este não caberá a retenção de INSS. Mas é preciso atenção pois isto só ocorrerá se estes serviços não forem de hidráulica, eletricidade, pintura, alvenaria, carpintaria e de manutenção ou reparo de veículos, os quais obrigam à retenção”, esclarece.
Avaliando apenas preço, o contador sugere considerar se vale contratar autônomo, ou se não seria melhor optar por uma empresa (autônomo tem recolhimento de 20% – contribuição patronal – e sobre o valor pago a empresa não haverá tal recolhimento). Ele deixa claro, porém, que este não deve ser o único critério de avaliação.
O cuidado visa apenas os aspectos contábeis e jurídicos, mas cabe ao síndico avaliar, ao selecionar o prestador de serviço, qualidade e confiabilidade.
“Se o condomínio se assegurar de cumprir com as obrigações legais e a documentação necessária de todo o processo, estará também garantido, independente de ser um autônomo ou empresa”, completa.
Evitando riscos – Rosana Brigagão, síndica do Condomínio Sobre as Ondas, Barra da Tijuca, zona oeste do Rio de Janeiro, conta que tem o cuidado de documentar todo o processo de contratação de serviços de autônomos, da mesma forma que faz com as empresas.
“Tenho administradora, mas diariamente acompanho a movimentação para confirmar se os valores foram lançados de forma correta e também o cuidado de cobrar o correto arquivamento de guias de recolhimento e demais obrigações do condomínio. Afinal, por melhor que seja a empresa, é nosso dever fazer este acompanhamento”, afirma.
Ao longo dos 13 anos que atua como síndica, diz ter conseguido criar um procedimento que lhe garante segurança neste tipo de contratação.
“Já apanhei muito, mas a gente aprende no caminhar das administrações. Hoje só pego autônomo, ou empresa, que tem referência de pessoa amiga”, destaca.
Além de contar com esta rede de informações, Rosana conta que faz questão de ir aos locais onde o prestador de serviço já trabalha para conversar com o síndico.
“Valorizo ainda o que consigo apurar com os porteiros. Eles sempre sabem de tudo”. Mesmo assim, nenhum acordo é firmado sem que ouça a opinião do advogado que atende o condomínio. “Procuramos levantar todas as informações possíveis e só depois levamos à assembleia para a decisão dos condôminos. Eles não escolhem nada no escuro”, complementa.
Outra medida é a de manter relações longas com bons prestadores de serviço. “Acabei formando um catálogo. Hoje tenho um pessoal de referência para cada tipo de serviço de que precisamos no condomínio”, afirma.
Vínculo empregatício – A iniciativa da síndica é correta e prudente, mas o contador Paulo César, a partir de sua experiência no contato diário com síndicos, alerta para que a regularidade não possa ser entendida, ou cobrada, depois para fins de comprovação de vínculo empregatício. “Na informalidade das relações com autônomo um risco é o de não respeitar as três “leis” básicas que caracterizam o vínculo empregatício”, diz.
Autônomo, é o trabalhador que desempenha seu ofício com autonomia, sem que haja subordinação, podendo livremente adotar procedimentos diversos na execução do seu trabalho. Diferente do empregado, não está sujeito a um controle diário de sua jornada de trabalho, bem como não cumpre, necessariamente, uma quantidade rígida de horas de trabalho.
“Há condomínios que na relação com o autônomo, o coloca para fazer serviços regulares, cedendo até um quartinho para que ele guarde seus pertences no condomínio e possa ali descansar. Se ele entrar na Justiça pedindo vínculo, ganha”, alerta, acrescentando que o prestador de serviço é um profissional e, por isto, não pode ser dirigido, nem receber ordens de ninguém do condomínio.
“A orientação deve ser dada antes de contratar. Ele também não poderá se fazer substituir por outra pessoa. Mas, a informação mais importante é a de que ele não recebe salário, portanto o pagamento deve ser por serviço executado”, finaliza.