O pianista Arthur Rubinstein gostava de contar a história do especialista em vinhos que certa vez convidara o compositor Johannes Brahms para jantar. “Este é o Brahms de minha adega”, disse ele a seus convidados, enchendo o copo do mestre com o vinho de uma garrafa empoeirada. Brahms olhou a cor do vinho, cheirou-o e, por fim, provou-o. “Hum”, disse depois de baixar o copo. “É melhor trazer seu Beethoven.”
Esse é o problema com vinhos antigos. Mesmo se mantidos em condições controladas de temperatura e umidade dentro de uma adega que custou milhões, o vinho pode ficar ruim, sofrer oxidação ou simplesmente não ter um bom sabor após anos de envelhecimento. Como alguém que teve a oportunidade de experimentar muitos vinhos antigos, já não me surpreendo mais quando uma grande safra, mesmo mantida sob condições ideais, torna-se um completo fracasso.
De fato, quanto mais velho fico e mais velhos ficam esses vinhos, mais convencido fico de que manter vinhos por décadas é um negócio muito arriscado. Em alguns casos, até os grandes vinhos podem começar a evaporar-se da garrafa, deixando um espaço com ar no gargalo, chamado “ullage”, motivo pelo qual alguns colecionadores abrem suas garrafas mais velhas periodicamente e as reabastecem sob a supervisão dos donos das propriedades produtoras.
Também existe a possibilidade de a rolha estragar o vinho, com algumas estimativas indicando que até 15% de todas as garrafas podem ser afetadas. Por esse motivo, nenhuma das casas de leilão mais famosas, como a Christie’s International, Sotheby’s e Hart Davis Hart, garantem a qualidade dos vinhos oferecidos.
É claro, muitos dos que compram vinhos antigos raros em leilões estão longe de serem especialistas e não têm nenhuma intenção de abrir as garrafas. Em vez disso, aguardam até revendê-las a preços mais altos, um efeito multiplicador que nos últimos anos vem sendo impulsionado em grande parte pelo mercado de leilões na China.
Donos de restaurantes ficam igualmente inquietos em vender vinhos muito caros e antigos, que muitas vezes constam do catálogo mais para serem exibidos do que por outros motivos. Embora as políticas difiram de restaurante para restaurante, muitos arcarão com o custo de uma garrafa comprovadamente ruim em seu catálogo que seja comprada por um cliente.
“Não podemos colocar rótulos de alerta em nossos vinhos”, diz Charles Masson, dono do La Grenouille, em Nova York, onde os clientes costumam ser muito ricos e muito leais. “Sempre há o risco de armazenar vinhos velhos, mas, se uma garrafa for realmente ruim, não faremos nosso convidado pagar por ela.” E se um cliente recusar uma garrafa porque simplesmente não gostou do sabor ou insistir equivocadamente que o vinho ficou ruim? “É uma situação embaraçosa”, diz Masson. “Mas, então, realmente cobramos o vinho, se soubermos que está bom.”
O La Grenouille está reabastecendo seu estoque e Masson vem preferindo adquirir menos vinhos de safras antigas. “Os preços atualmente estão muito altos e há uma demanda menor de nossa clientela”, afirma. “Na verdade, os encorajamos a experimentar vinhos mais novos e menos caros, mais propícios à refeição, do que pedir um Haut-Brion 1998 que custa US$ 2.250 em nosso catálogo.”
A tradição de beber vinhos muito velhos é mais britânica do que francesa, especialmente entre os britânicos há muitos anos envolvidos no comércio de vinhos franceses. Agora, a tecnologia e a preferência culinária tornaram beber vinhos mais jovens, frescos e confiáveis uma ideia mais razoável do que assumir o risco de optar por um vinho mais velho, cujos melhores dias podem ter ficado no passado.
“Uma safra normal envelhece e perde seu auge mais rapidamente”, diz Corinne Mentzelopoulos, dona da propriedade Chateau Margaux, que tem classificação “premier cru”, em Bordeaux. “Mas ótimas safras, como 1953, 1959 e 1961, são as melhores e mais emocionantes experiências que se pode ter e, quando mantidas por especialistas em vinho que os conhecem, podem ficar ainda melhores com mais envelhecimento.”
Mentzelopoulos diz que a vinicultura moderna lhe permite mais liberdade na forma como produz seus vinhos: “Podemos esperar e colher as uvas quando acreditamos que chegaram ao ponto certo, o que eu considero uma das mudanças mais importantes em Margaux e em Bordeaux.”
No passado, os produtores precisavam colher as uvas antes, para que não se estragassem, afirmou. Agora, nos anos das melhores safras, os plantadores em Bordeaux podem colher no momento mais apropriado, quando os taninos estão maduros e, portanto, mais suaves, o que torna os vinhos mais agradáveis para se beber desde o início.
“Portanto, sim, eles podem ser bebidos antes, embora existam algumas safras que continuam muito ásperas quando jovens”, disse Mentzelopoulos. “Nas safras entre boas e ótimas, ainda é melhor esperar.”
Ela diz que apenas algumas propriedades em Bordeaux e Borgonha produzem vinhos que melhoram enquanto envelhecem. Vinhos de outras regiões e de safras de menos qualidade devem ser bebidos antes “porque eles passam de seu auge com mais rapidez”.
Em outras palavras, poucos vinhos, ou poucas pessoas que os bebem, envelhecerão com elegância– algo a se ter em mente quando se pede uma garrafa mais velha do que você. Fonte:Valor