Quer saber o segredo para fazer uma fortuna em pouco tempo aplicando pequenos valores no mercado financeiro? Pois deixe de se iludir e comece a pensar seriamente sobre a sua vida financeira, responde a planejadora financeira pessoal Gisele Colombo de Andrade. “Essa história de que é possível ganhar muito dinheiro no mercado financeiro é um grande mito”, alerta Gisele.
Isso não significa que os investimentos devam ser deixados em segundo plano, ressalta Gisele. Eles podem elevar – e muito – o valor do patrimônio de uma pessoa ao longo dos anos. “Mas o fundamental para gerar riqueza é o dinheiro que as pessoas ganham com o seu trabalho”, diz ela. Quer uma prova? Os próprios gestores de recursos vivem de vender sua habilidade de ganhar no mercado, em vez de ficar em casa aplicando o próprio dinheiro.
Frustrado com a resposta? Pois saiba que “frustrar” investidores é uma das tarefas de um planejador financeiro responsável, ressalta a planejadora Angela Nunes Assumpção. “Frustrar no curto prazo para ajudar as pessoas a construir um bom patrimônio no longo prazo é a nossa tarefa”, diz Angela. “E, com o tempo, à medida que a pessoa se planeja e realiza seus sonhos, a frustração dá lugar ao prazer de poupar”, diz o planejador Fabiano Calil.
Gisele, Angela e Calil integram o grupo de profissionais do Instituto Brasileiro de Certificação de Profissionais Financeiros (IBCPF) – entidade responsável no Brasil pela concessão da certificação internacional CFP (Certified Financial Planner), que distingue os planejadores financeiros pessoais.
Consultores de múltiplas especialidades que desenham estratégias de planejamento de patrimônio para pessoas físicas, os profissionais ligados ao IBCPF são responsáveis pelas respostas dadas aos leitores do Valor na seção “Consultório financeiro”, que acaba de completar um ano de vida. O tema dominante nesse período foram os investimentos. “As pessoas ainda têm essa ideia de que planejamento financeiro é apenas escolher onde aplicar o dinheiro; é muito mais do que isso”, diz Calil.
Cabe ao planejador traçar um plano de voo com metas de curto, médio e longo prazos, que incluem aspectos como herança, contratação de seguros, administração de bens, tomada de empréstimos e formação de poupança para a aposentadoria. “No fundo, é uma questão comportamental, que tem a ver não só com a pessoa, mas como toda a família”, diz Angela. “Quem já passou por um inventário complicado sabe como problemas de dinheiro acabam com o relacionamento familiar”.
E a adoção de um planejamento financeiro não depende de faixa de renda ou escolaridade, ressalta Angela. “O nosso público é amplo, inclui desde funcionários públicos e profissionais liberais até empresários, artistas e jogadores de futebol”, diz Calil. “E essa experiência do ‘consultório’ reforçou isso, já que recebemos desde perguntas bem simples, sobre orçamento doméstico, até questões mais complexas, de pessoas com patrimônio de alguns milhões”, afirma Gisele.
O valor de uma consulta com um planejador financeiro varia de acordo com a região e a experiência do consultor. Uma sessão de uma hora ou uma hora e meia com um planejador “júnior” de São Paulo pode sair em torno de R$ 300. Embora os planejadores muitas vezes sejam contratados para resolver questões específicas, como problemas na transmissão de patrimônio, o ideal é que haja um conjunto de seções para a realização de um planejamento de longo prazo. “Nesse caso, o mais comum é fechar um pacote de remuneração”, diz Calil.
O ponto de partida de qualquer planejamento é a formação de uma reserva financeira (entre três e 12 vezes o valor das despesas mensais) para ser utilizada em casos de emergência, como acidentes ou perda do emprego. Em seguida, é hora de traçar os planos para acumular os recursos para realização de sonhos de curto, médio e longo prazo. “Uma das questões que mais preocupam as pessoas hoje é a aposentadoria”, diz Angela. “E o cenário é complicado, porque as pessoas não estão dimensionando corretamente o quanto têm que poupar”.
O erro mais comum nesses casos, conta Angela, é superestimar os ganhos com investimento na fase de acumulação e subestimar os gastos na aposentadoria. “Há um mito perigoso de que os gastos caem automaticamente”, afirma. “Não há mais as despesas com educação dos filhos, por exemplo, mas surgem contas cada vez maiores com a saúde”. Ela recomenda aos investidores que sejam muito conservadores ao estimar os ganhos de seus investimentos e sempre acumulem recursos pensando em viver “até os 100 anos”. “Essa é uma das formas de não se decepcionar lá na frente”, diz. “Pelo que eu vejo hoje, muitas pessoas não terão a renda que imaginam se não repensarem suas estratégias”, diz.
Quem está com as contas fora de ordem, contudo, não deve se desesperar. As transformações na vida financeira não acontecem do dia para noite. “Quem nunca fez exercício e, de repente, tem que deixar o sedentarismo sabe como é difícil”, diz Calil. “Com as finanças, é a mesma coisa, as mudanças são graduais”.
Fonte: Valor