A expectativa de juros menores e inflação ainda pressionada tem levado muitos investidores a obter retornos altos com aplicações que buscam proteger o patrimônio contra a alta de preços. Além de ter aumentado bastante a procura por títulos atrelados à inflação medida pelo IPCA no Tesouro Direto – sistema de compra e venda de papéis públicos pela internet -, os fundos renda fixa índices também vivem um momento de ebulição.
Levantamento do Valor com base nos dados da Economática mostra que essas carteiras – que aplicam em títulos prefixados e papéis atrelados à variação de preços – registram somente neste ano retorno médio de 2,89% até o dia 17. O ganho supera, com folga, a variação de 1,40% do Certificado de Depósito Interfinanceiro (CDI) no período. O CDI é o juro interbancário que serve de referencial para as aplicações mais conservadoras e representa o custo de oportunidade do investidor. No ano passado, esses fundos renderam, em média, 13,81% ante 11,60% do CDI.
Mas o que tem levado essas carteiras e os títulos atrelados à inflação a terem ganhos maiores que outras aplicações de renda fixa? A resposta está em dois fatores: a perspectiva de uma taxa básica de juros de um dígito e a inflação em níveis considerados altos.
Esses fundos de investimento classificados como renda fixa índices são recheados de Notas do Tesouro Nacional série B (NTN-B), que remuneram o investidor com uma taxa prefixada – chamada cupom – mais a variação do IPCA. E esses títulos tendem a se valorizar quando há um movimento de redução da taxa básica de juros.
Diante da expectativa de uma Selic de um dígito, os juros futuros começaram a se adaptar ao novo cenário, trazendo um retorno extra aos investidores e fundos de renda fixa que podem aplicar em papéis prefixados – uma das características da NTN-B. Quando o juro cai, o preço do papel sobe, ajustando-se ao novo panorama. Com isso, aqueles que têm um papel de renda fixa com retorno prefixado maior têm ganhos.
Outro fator que beneficiou esses papéis é justamente no fato de a inflação medida pelo IPCA continuar relativamente alta. Isso faz com que as NTN-Bs consigam ganhar também nessa ponta.
Na semana passada, o boletim Focus – que traz as expectativas do mercado – divulgado pelo Banco Central (BC) mostrou que os agentes reduziram de 5,29% para 5,24% a projeção para o IPCA de 2012. Já para a taxa Selic, a previsão é de queda para 9,5% no fim do ano.
Apesar de as projeções para a inflação terem diminuído nas últimas semanas, o movimento deve ser sazonal, ressalta Marcelo Pereira, sócio da TAG Investimentos. “Não acho que o arrefecimento seja duradouro. É preciso lembrar que o funcionalismo público conseguiu reajuste salarial de 14% e os trabalhadores da construção civil, de 19%”, exemplifica.
O ganho diferenciado dos fundos renda fixa índices se deve ao fato de eles terem comprado NTN-Bs lá atrás, quando os retornos eram ainda maiores do que os atuais, e agora estão enchendo o bolso de dinheiro, explica Pereira. Para ele, apesar de menores, os ganhos desses títulos se mantêm atrativos (ler reportagem na página D2). “Mas o investidor precisa estar ciente de que há volatilidade e que ele pode ter perdas em um momento adverso de mercado.”
Faz todo sentido, especialmente neste momento, que o aplicador fique mais atento ao ganho real, já que os juros estão cada vez mais baixos e a inflação, salgada, diz Ricardo Valente, gestor de renda fixa da CSHG. Para ele, a alta de preços neste ano deve ser menor que no ano passado – quando o IPCA subiu 6,5% -, mas em níveis ainda altos. “O investidor deve se preocupar em ter papéis atrelados à inflação não só para ganhar dinheiro, mas como proteção mesmo”, diz.
O gestor da CSHG – ao contrário de alguns no mercado – tem reduzido o prazo médio dos papéis em carteira. No ano passado, o prazo era de quase sete anos e agora, de cinco. “E pretendo reduzir mais ao longo do semestre.”
Esse encurtamento se deve ao fato de a equipe da gestora esperar que a economia brasileira volte a se expandir mais fortemente no fim do primeiro trimestre e início do segundo. “Dada a atividade robusta, não esperamos que BC corte tanto os juros como o resto do mercado acredita”, diz. Se isso se concretizar, os papéis mais longos seriam afetados. Por isso, o gestor vem optando por trocar gradativamente títulos com vencimentos mais longos pelos mais curtos.
Essa visão, no entanto, não é compartilhada por João Scandiuzzi, estrategista-chefe para Asset Management do BTG Pactual. Ele ressalta que o cenário de juros em queda e inflação também em queda faz com que os papéis mais curtos sofram, enquanto os mais longos sofrem menos. Por isso, o gestor vem se concentrando mais em papéis com vencimento entre 2014 e 2016. O contexto mundial é de menor inflação, com a China desacelerando gradativamente, o que também desaquece a economia brasileira, permitindo uma inflação mais baixa, diz Scandiuzzi.
Ronaldo Patah, superintendente de renda fixa da Itaú Asset. alerta que a rentabilidade dessas carteiras poderá ficar abaixo do CDI em alguns meses do ano. “Não devemos esperar uma rentabilidade tão boa quanto em janeiro e fevereiro.” No acumulado de 2012, a perspectiva de Patah é de que os fundos de índices superem o IMA e o CDI. Antes disso, entretanto, eles devem testar o estômago dos aplicadores. “Pode chacoalhar bastante; por isso, a indicação é para um investidor moderado”, diz o superintendente. O horizonte ideal de aplicação, segundo ele, é de pelo menos dois anos. “Como esse governo tem uma preocupação muito forte com o crescimento, a inflação vai ser um risco constante.”
O Itaú projeta inflação em 5,3% para este ano, mas acredita que o risco de ela ultrapassar esse patamar é maior do que o de ficar abaixo dele. Uma aceleração da economia é esperada já para o segundo trimestre. A volta da pressão inflacionária pode chamar o governo a interromper ou desacelerar a trajetória de queda da taxa básica de juros. “Esse movimento da curva de juros parece um pouco exagerado na queda”, diz Patah.
A inflação deve voltar a se acelerar a partir do segundo semestre, para Luis Roberto Zaratin, superintendente de gestão de investimentos da BES Ativos Financeiros (Besaf, do português Banco Espírito Santo). No começo do ano, a gestora mexeu no portfólio para incluir apenas títulos públicos indexados ao IPCA.
Apesar de não trabalhar com uma perspectiva de alta para a inflação, Marcelo de Jesus, superintendente nacional de gestão de ativos da Caixa Econômica Federal, aposta que a rentabilidade dos fundos de renda fixa índices continue alta ao longo do ano. “Ainda há oportunidades de capturar juros reais bem mais elevados do que os de outros países, inclusive em papéis de prazo mais longo”, diz. Fonte:Valor