Gerou muita discussão a mudança na postura do BC quando, nos primeiros meses do ano, passou a sinalizar que, para controlar uma inflação ascendente, teria de puxar a taxa Selic para patamares mais altos dos que os 7,25% que vigoravam naquele momento. Desde então, as taxas de juros de curto prazo saíram de 7,25% para 9% e o IPCA, que atingiu um máximo de 6,70% no período dos 12 meses anteriores, recuou apenas modestamente para 6,08%. E, apesar das ações já tomadas pelo BC, o mercado acredita que ainda mais precisa ser feito. Usando a curva de juros futuros como fonte de inferência para o comportamento da taxa nos próximos meses, é possível concluir que o mercado acredita que a taxa Selic deveria ir para algo um pouco abaixo de 10,50% ao ano até o final de 2013 (e permanecer lá ao longo de 2014).
Esta mudança de rumo na condução de política monetária teve reflexos nos mercados financeiros, principalmente no de juros prefixados. O investidor que se manteve exposto a este segmento ao longo deste ano não foi compensado pelo risco que tomou. O IRF-M (índice que reflete o retorno desta classe de ativos) rendeu até setembro 1,4% contra um retorno do CDI de 5,65% no mesmo período. Apesar dos retornos modestos, será que o pior não ficou para trás e agora é exatamente o melhor momento para aumentar a exposição a uma classe de ativo que já sofreu bastante no ano?
Não é uma pergunta fácil, pois o comportamento futuro de papéis prefixados depende de uma ampla gama de variáveis. Dentre elas, o comportamento futuro da inflação e a própria atuação do BC sejam talvez as mais importantes para determinar se este mercado vai apresentar retornos atraentes no futuro próximo. De maneira simplista, quanto mais atuante o BC e mais estável o comportamento da inflação, melhor para o comportamento dos juros.
Apesar da justa fama de leniência com uma inflação média mais alta, o BC tem sinalizado que desta vez está disposto a apertar a política monetária até onde for necessário para manter a inflação “sob controle” – leia-se: um IPCA neste ano um pouco abaixo do ano passado, seguido por nova queda no ano que vem. Não parece uma meta agressiva, mas mostra que os juros poderiam subir ainda mais caso fique claro que a inflação está saindo do controle (ou seja, subindo mais). Ao mudar o discurso justamente no momento em que a inflação ameaçou ultrapassar o teto da banda imposta pelo regime de metas, a diretoria do BC mostrou que, se não está muito preocupada em atingir o centro da meta, também não quer ver a inflação muito acima do patamar crítico de 6% a.a. Por essa sinalização, parece justo dizer que o BC planeja apertar os juros básicos ainda mais se o IPCA voltar a rodar nestes níveis, mesmo com a proximidade de um período eleitoral. Dado o passado recente da instituição, é verdade que esta ainda é uma questão em aberto. No entanto, os integrantes do Copom entendem perfeitamente as repercussões sobre expectativas de prometer e não cumprir.
Se o BC vai ou não perseguir uma política monetária menos heterodoxa, dependerá muito do que acontecer com o IPCA ao longo do ano que vem. Uma inflação relativamente “bem comportada” (índices em leve queda em relação ao patamar atual) facilitaria o trabalho do BC criando potencialmente boas oportunidades de investimento no segmento de prefixados.
Índices de inflação rodando acima dos 6% a.a. são uma fonte de preocupação constante dos investidores locais. O fato de o ponto de partida ser bastante alto adiciona um risco relevante ao processo inflacionário: choques adversos tendem a ser rapidamente repassados aos preços domésticos, aumentando a probabilidade de os índices ultrapassarem o teto da banda, ensejando alguma reação das autoridades monetárias. E inflação fora de controle, mesmo forçando a autoridade monetária a reagir posteriormente, tem impactos potencialmente danosos sobre o segmento de prefixados. Mas será este o caso do nosso mercado?
Aparentemente não. Apesar das preocupações dos investidores, as projeções do mercado para o comportamento da inflação dizem que o cenário de preços cadentes nos próximos meses pode ser factível mesmo com um aumento marginal nas taxas básicas de juros. Pelo Relatório Focus, os economistas de mercado projetam que, com a taxa Selic a 9,75%, o IPCA ficaria em torno de 5,85% para o final de 2014. As projeções do próprio BC, usando o cenário de mercado, chegam a um IPCA de 5,7% para o ano de 2014, caindo para 5,3% no 3º tri/2015. Mas será que estas projeções são realmente atingíveis em um cenário de desvalorização cambial forte como o observado este ano? Aparentemente sim. E a razão pela qual a inflação ficaria mais ou menos estável mesmo neste ambiente adverso é o crescimento muito modesto que o país deve observar nos próximos anos, que deve ajudar o trabalho do BC. O menor crescimento deve ter reflexos sobre o mercado de trabalho e de serviços, ajudando trazer um pouco para baixo um elemento importante nos números recentes: a inflação de serviços. Além disso, uma inflação de alimentos mais baixa nos próximos meses também parece razoável. Assim, crescimento fraco, preços agrícolas mais bem comportados e uma política monetária mais apertada seriam suficientes para contrapor a pressão altista advinda do câmbio e preços administrados, mantendo a inflação relativamente estável, mesmo com aumento apenas marginais da taxa Selic.
Ora, os investidores já precificam um cenário onde a taxa de juros básica suba até os 10,50% no final deste ano e prossiga até aproximadamente 12% a.a. nos anos posteriores. No entanto, se o cenário discutido aqui se materializar e o crescimento modesto atuar em favor do BC, as oportunidades de ganhos de capital em papéis prefixados tornam-se bastante interessantes, compensando parcialmente a pobre performance do segmento até agora.
Fonte:Valor