Quando ganhou seu primeiro salário, como modelo publicitária, Naomi, 11 anos, não teve dúvida. Entregou o cheque para o pai investir. Era o sinal de que ela tinha entendido a mensagem. Orgulhoso, George Wachsmann, sócio da gestora de patrimônio GPS, somou os recursos às aplicações que faz para ela e o filho, Michel, 9 anos, desde 2006. No começo, os aportes eram mensais. Depois, passaram a duas vezes ao ano, casados com os bônus.
O portfólio inicial formado por ações e títulos públicos, para aproveitar os altos juros da época, tem hoje somente renda variável. É uma carteira recheada de fundos de ações, valioso pé-de-meia para quando Michel e Naomi concluírem a faculdade. “Eles podem fazer o que quiserem, como comprar um apartamento ou investir em um negócio. A ideia é que seja o primeiro dinheiro deles”, diz Wachsmann.
O sócio da GPS aprendeu em casa a pensar no futuro financeiro dos filhos. No dia em que se formou, ganhou do pai um cheque no valor de 48 mensalidades de uma faculdade particular, correspondentes aos quatro anos sem custos que passou na Universidade de São Paulo (USP). “Usei para comprar meu primeiro carro”, diz. O pai também fez uma poupança, destino que, pela simplicidade, com frequência atrai reservas para a próxima geração. Especialistas em gestão de recursos versam uma cartilha mais arrojada: como a premissa é o longo prazo, o destino preferido para o dinheiro dos filhos é a bolsa. Em véspera de Dia das Crianças, quando o consumismo predomina, por que não aproveitar o momento para dar início à educação financeira de seu filho?
Um fundo formado por carteiras de diferentes gestores de ações é também o destino das reservas de Nicholas, 3 anos. No dia em que ele nasceu e, desde então, a cada aniversário, o portfólio recebe novo aporte. Isso não significa que o dinheiro é fácil para ele. Quando quer comprar um brinquedo, Nicholas precisa recorrer ao seu cofrinho, em que acumula moedas com afinco. Os recursos do fundo de investimentos são só para quando fizer 18 anos. “Fundo para ele até agora é piscina onde não dá pé”, brinca a mãe Renata Luz, sócia da gestora de patrimônio G5.
A escolha da renda variável para os investimentos do Nicholas está ligada ao entendimento de que os juros brasileiros no longo prazo têm tendência decrescente. Gestores bem selecionados, considera a sócia da G5, tendem a gerar ganho relevante em relação ao Ibovespa ao longo dos próximos 20 anos.
A opção por um fundo de ações também está ligada à tributação, de 15% sobre o rendimento na data do resgate. Um multimercados teria tributação semestral, o chamado “come-cotas”. Para o investimento direto em ações, não há taxa de administração, mas o IR deve ser pago em vendas superiores a R$ 20 mil por mês. Além disso, é preciso acompanhar de perto a carteira.
Já Luiz Fernando Figueiredo, sócio-fundador da gestora Mauá Sekular Investimentos e ex-diretor do Banco Central (BC), preferiu montar sua própria carteira de ações pensando no futuro dos quatro filhos, de 22, 19, 9 e 4 anos. Para isso, investe recursos em ações de duas companhias, que troca a cada dois ou três anos. No momento, são BRF e Tupy. “Procuro ações de empresas que vão passar por mudanças relevantes nos próximos três a cinco anos”, diz.
Luciane Ribeiro, à frente da gestora do Santander, quer montar uma carteira de ações a partir do ano que vem para Paulo Guilherme, o filho de 12 anos. “Quero que ele participe dessa decisão, que entenda a lógica”, afirma. A ideia dela é escolher com o filho empresas de setores importantes para o país. “Vou trabalhar para que ele não venda essas ações, que no longo prazo certamente vão dar bons retornos”, diz.
Paulo Guilherme é ainda beneficiário em um plano de previdência do tipo PGBL. Este produto também faz parte da estrutura criada por Paulo Bittencourt, diretor técnico da Apogeo Investimentos, para a filha Giovanna, 10 anos. Um mês depois de ter nascido, a menina já tinha CPF. Bittencourt escolheu um plano em que, até a filha completar 21 anos, um percentual pequeno das contribuições é descontado a título de seguro de vida. “A ideia é que, na minha falta, ela tenha dinheiro para pagar a faculdade”, diz.
Giovanna também tem um pezinho na bolsa. O mesmo valor que investe mensalmente no PGBL, Bittencourt aplica em um fundo que investe em ações de boas pagadoras de dividendos. A escolha está relacionada às características das companhias que costumam integrar esse tipo de carteira, em geral maduras. “Foi a maneira pela qual eu travei o trabalho do gestor, que não pode entrar em uma empresa pré-operacional, por exemplo.”
Nas compras no supermercado, Bittencourt mostra à filha os produtos das empresas das quais ela também é ‘dona’. “Isso faz parte do processo. Investir escondido não vale a pena. Também é bom para ela perceber que o valor vai sendo construído com o tempo, não surge do nada.” Giovanna já tem planos para o patrimônio acumulado: estudar no exterior.
“Quando você olha o histórico, percebe que a única coisa que faz ganhar de longe da inflação é o crescimento patrimonial das empresas”, diz Bittencourt. Quanto ao costume de aplicar dinheiro para os filhos em poupança, ele é incisivo. “Acho um péssimo negócio.”
Bittencourt simula o que ocorreu com R$ 10 mil aplicados para uma criança hoje com dez anos no dia em que ela nasceu. Na poupança, o valor teria se transformado em R$ 20.670. Em um fundo DI com taxa de 2%, em R$ 22.884. Em um fundo com taxa de 2% que busca superar o Ibovespa, a criança teria hoje R$ 24.373. “Parece pouco em termos nominais, mas a diferença no caso do fundo de ações é de retorno 18% maior e, no caso do DI, de 11%. Em um prazo mais longo, o estrago seria maior”, afirma.
Na casa de Sergio Prates, superintendente de produtos de previdência da Icatu, a cartilha da empresa é seguida à risca. Logo que João Guilherme, 9, e Gustavo, 5, nasceram, eles ganharam fundos de previdência arrojados, com 49% em ações e 47% em IMA-B 5+, uma cesta de títulos públicos de prazo longo indexados à inflação. Prates escolheu um produto sem taxa de carregamento na entrada. Ele somou aos planos seguros que vão garantir, no caso de sua invalidez, que os filhos resgatem R$ 1,5 mil por mês durante quatro anos, para pagar a faculdade, e que, se falecer, eles recebam pensão mensal de R$ 1,5 mil durante 20 anos.
Quando o plano é feito no CPF dos filhos, eles podem resgatar os recursos a partir dos 18 anos. Prates prefere deixar em seu nome. “Quando eu achar que eles já têm cabeça suficiente, troco para o CPF deles”, diz. O ideal, para Prates, é que os filhos continuem a contribuir com foco na aposentadoria. “Eu brinco que essa é a maneira mais fácil de chegarem ao primeiro milhão.” Para uma aplicação de R$ 150 reais por mês desde o nascimento, a um rendimento otimista de 6% reais ao ano, simula, a criança terá R$ 1 milhão aos 60 anos.
Na Icatu, 15% das vendas são hoje para clientes de até 18 anos. Uma pesquisa interna mostrou que as intenções são, pela ordem, o pagamento da faculdade, de um intercâmbio e um empurrão inicial para os negócios. Neste mês, a seguradora rendeu-se a um produto já existente em outras casas: um plano voltado para crianças. Além dos seguros atrelados, o plano tem proposta, certificado e extratos amigáveis aos pequenos.
Fonte:Valor