A administradora Cibele da Silva se viu em um dilema há um ano. Com R$ 6 mil aplicados na poupança e outros R$ 5 mil em previdência privada, tinha a sensação de que suas economias poderiam render mais. Na época, sem conhecimentos sobre os produtos financeiros, decidiu pedir ajuda a um consultor de seu banco. “Perguntei sobre Tesouro Direto, que parecia ser bem seguro e rentável”, diz. Entretanto, em lugar de títulos públicos, saiu de sua agência com mais dinheiro alocado no plano de aposentadoria e outro tanto em um fundo DI. “Achei as dicas legais. Acabei também usando uma parte do que tinha guardado para viajar nas férias.”

Até o fim de 2011, nem mesmo o dinheiro deixado no fundo resistiu. “A ideia era aplicá-lo por dois anos, mas precisei fazer o resgate antecipado para quitar um financiamento”, conta. Agora sem dívidas, Cibele quer voltar a aplicar seus recursos. E continua a pensar em títulos do governo. “Mas ainda não conheço nada sobre Tesouro Direto”, admite a administradora.

Os percalços da administradora em busca de melhor rentabilidade ilustram padrões de comportamento comuns a milhares de brasileiros. Isso porque, por mais que tenha consciência da importância de saber administrar bem os recursos, grande parte das pessoas parece sofrer de uma espécie de aversão a lidar com investimentos. “É mais fácil receber uma resposta pronta que pesquisar”, explica o especialista em finanças comportamentais e consultor do Itaú, Jurandir Macedo.

Na tentativa de explicar o pouco cuidado com o próprio dinheiro, muitos citam a falta de tempo, o desconhecimento dos produtos e até o orçamento apertado. A verdadeira natureza desse comportamento, no entanto, tem, em geral, outros nomes, como indisciplina e preguiça. Quem se identificou com esse perfil, porém, não deve se sentir culpado. A explicação para essa reação vem da própria maneira pela qual o cérebro atua quando se depara com assuntos complexos. De acordo com Macedo, como regra geral, o ser humano tende a atrasar o que não gosta e adiantar aquilo que aprecia. “A maioria não gosta de lidar com o que não entende bem. E pensar no futuro coloca para funcionar o córtex, que é a parte mais nova, mais sofisticada e, por isso, também a mais lenta do cérebro.”

Para os indisciplinados convictos – sejam conscientes ou não – nem tudo está perdido. A internet trouxe ferramentas que, se não resolvem, diminuem, e muito, o custo da inércia. Para quem vai “esquecer” que o dinheiro aplicado existe, a melhor estratégia é automatizar todo o processo.

Hoje qualquer internet banking possibilita ao usuário programar aportes periódicos em praticamente todo tipo investimentos com débito direto da conta. Há desde fundos de variados perfis de riscos, a ações, títulos do tesouro, CDB, PGBL, VGBL e, obviamente, a poupança.

Mas, ainda que tenha a possibilidade de agendar o débito em conta e deixar os sistemas bancários resolverem tudo por ele, o investidor passivo primeiro precisa gastar um pouco de seu tempo para ao menos entender as vantagens, desvantagens e os riscos de cada produto. “Para esse tipo de público é essencial pensar no longo prazo. Sem disciplina, quem tem alguma sobra de dinheiro vai fatalmente gastá-la”, explica o professor de Finanças da Escola de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Ricardo Ratner Rochman.

Na avaliação do especialista, uma opção para os indisciplinados são os planos de previdência privada. Segundo Rochman, tanto os VGBL quanto os PGBL ajudam a criar uma obrigação de poupar. E com baixo risco e possibilidade de ganhos superiores aos da tradicional caderneta. “Quem não é organizado e não quer gastar tempo pensando em investimentos pode definir um valor de alocação e simplesmente programar um débito em conta para uma previdência.” O professor da FGV lembra que os produtos não precisam ser focados apenas em aposentadoria. “A pessoa define se quer contratar um plano para a faculdade dos filhos ou para garantir o pagamento de planos de saúde no futuro”, explica.

Em relação ao PGBL e ao VGBL, o investidor precisa ter consciência de que essas aplicações são voltadas para períodos longos. Os contratos costumam incluir carência para saques antecipados, taxas de carregamento – um percentual, em geral de 1%, cobrado sobre cada aporte – e taxas de administração. Além disso, há a incidência de Imposto de Renda (IR), cuja alíquota varia conforme o tempo em que o dinheiro permanece aplicado. Ou seja, quem retira os valores antes dos prazos definidos para o plano vai arcar com encargos e alíquotas mais elevadas. “Essa característica acaba sendo um incentivo para manter o dinheiro no produto”, avalia o especialista da FGV.

“Até mesmo alguém muito indisciplinado não vai se estressar para responder a uma pergunta básica: em qual prazo ele quer investir?”, afirma o professor de Macroeconomia e Finanças do Insper, Marcos Moura. O tempo em que se pretende manter o dinheiro sem utilizá-lo vai definir a melhor opção de investimento, avisa o especialista.

E quem nem ao menos sabe quando pretende resgatar os recursos? Nesse caso, deve trabalhar com um horizonte de curto prazo. A melhor estratégia é programar as aplicações com débito em conta para um fundo de renda fixa com taxa de administração de, no máximo, 1% ao ano. “Caso contrário, é melhor deixar na nova poupança”, explica Moura.

Uma alternativa para aplicações programadas de curto prazo são os CDBs. A maioria dos bancos oferece a opção de débito em conta para investimentos em títulos do gênero. E o intervalo de agendamento pode ser feito conforme o interesse do correntista, como descontos a cada mês ou em períodos mais longos. Como há incidência de IR com alíquota regressiva – de 22,5% nos primeiros seis meses até alcançar o valor mínimo de 15% após dois anos -, para ganhar da caderneta tradicional o CDB tem de garantir retorno acima de 92% do CDI.

A vida financeira pode ter ficado mais fácil na era digital, mas o preço da indisciplina ainda é alto. Vencer a barreira motivacional, educar-se financeiramente e cuidar das aplicações ainda são as únicas soluções reais para não perder dinheiro. “Você tem de tratá-lo como seu amigo. Se não der atenção a ele, o dinheiro vai te tratar mal também”, diz o consultor de finanças pessoais Antonio De Julio, da MoneyFit. “Ainda que a gente tenha tablets, smartphones e notebooks muita gente acha um sacrifício se informar sobre finanças. E no futuro essas mesmas pessoas vão reclamar que sua poupança rende pouco.”

Fonte:Valor

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