Em uma tarde recente de abril, uma limusine com dois perfumistas franceses da multibilionária International Flavors & Fragances (IFF), de Manhattan, parou em frente a um prédio abandonado no South Bronx, tomado por invasores. Os perfumistas, Bruno Jovanovic e Pascal Gaurin, levavam um frasco de seu mais novo preparado, o L ‘ Eau Verte du Bronx du Sud (A Água Verde do Sul do Bronx, em francês) para mostrá-lo a Majora Carter, uma importante consultora ambiental e moradora do bairro. O perfume não era para Carter.
O destinatário almejado era uma obra residencial de baixa renda nas proximidades – Sister Thomas Apartments. Espalhando a fragrância pelos corredores e áreas comuns do prédio, o improvável trio acredita que os 200 moradores serão infundidos de otimismo e felicidade. “A parte de seu cérebro que sente a fragrância pode te fazer sentir realmente mal com o que você vê na sua frente – ou realmente bem – dependendo do que for”, explica Carter. “A questão é: Como evocar-se certos sentimentos sem impor-se às pessoas de alguma forma?”
A indústria de perfumes pensa ter a resposta. Jovanovic e Gaurin, responsáveis por colônias e perfumes de luxo como o Tom Ford Black Violet e o Giorgio Armani Onde Extase, encabeçam a mais nova mania das empresas de fragrâncias, uma forma de conceito de diferenciação sensorial conhecida como “aromatização de ambiente”. Jovanovic, de 34 anos, ajudou a desbravar a tendência ao criar o aroma “amadeirado” – uma combinação de laranja, resina de abeto e jacarandá brasileiro, entre outros – para a Abercrombie & Fitch. Desde seu lançamento nas lojas de roupas da empresa nos Estados Unidos há dois anos, o Fierce, da Abercrombie, que também impregna as calçadas do lado de fora, tornou-se parte integral da experiência de compra. A demanda popular instigou a empresa a produzir a marca do perfume em garrafas. Segundo Jovanovic, alguns clientes reclamam quando as camisetas compradas nas lojas perdem o aroma após várias lavagens.
Aromatizar um prédio inteiro é a nova ambição de um segmento em expansão que, por anos, passou despercebido pela maioria dos consumidores. Roger Bensinger, vice-presidente executivo de marketing de fragrâncias da Prolitec, estima que há 20 empresas no mundo especializando-se na comercialização de aromas de ambiente e em tecnologias de dispersão. Embora muitas dessas empresas sejam de capital fechado, executivos do setor avaliam os negócios entre US$ 80 milhões e 100 milhões. Essas empresas se aliam a fabricantes de fragrâncias e dividem a tarifa cobrada pela aromatização e manutenção, que pode variar de US$ 100 a US$ 10 mil por mês, dependendo do tamanho do espaço.
A aromatização de ambientes, tendo conseguido sair do confinamento das lojas de lingerie, tornou-se prática comum nos cassinos no início da década de 2000 e invadiu o setor de hotelaria logo em seguida. O Sheraton Hotels & Resorts usa o Welcoming Warmth, uma mistura de figos, jasmim e frésias. O Westin Hotel & Resorts emprega o White Tea , que tenta proporcionar a indefinível experiência de “refúgio zen”.
Tentar ligar uma marca aos aromas também está se tornando tendência no varejo. Pesquisadores acreditam que as fragrâncias permitem aos consumidores estabelecer uma conexão mais profunda com a marca, o que levou muitas empresas de setores diferentes a entrar na moda. Recentemente, Gaurin, 41, ajudou a criar uma fragrância para as lojas da Samsung, que é citada como um marco como projeto de aromas. Uma pesquisa, que a IFF não divulga por motivos contratuais, mostrou que os clientes sob a sutil influência de sua criação não apenas passaram um tempo em média 20% a 30% maior na loja, como também associaram o aroma – e por extensão a marca – a características como inovação e excelência.
Embora haja escassez de pesquisas independentes, o número de empresas que testam o terreno indica um fenômeno em crescimento. O próximo lançamento da Coty de uma fragrância da marca Guess também será usado para aromatização interna, o que não deixa de ser bastante natural para uma empresa de perfumes. Companhias de outros setores, como Credit Suisse, De Beers e Sony também vêm experimentando a aromatização de ambientes em seus espaços de varejo.
Não é de surpreender que muitas empresas se mostrem céticas sobre os benefícios de investir em uma fragrância distintiva, enquanto outras prefiram manter seus experimentos olfativos em sigilo. Ainda assim, os grandes nomes do setor, como Firmenich, Givaudan, Symrise e, em particular, IFF preveem a expansão do mercado caso consigam reunir pesquisas suficientes para provar definitivamente que os aromas evocam respostas emocionais específicas que preparam os consumidores para gastar. E, embora haja muita discussão dentro do setor sobre os benefícios potenciais de uma experiência olfativa artificialmente arquitetada para vários produtos, – telefones celulares aromatizados são uma área quente, assim como o aproveitamento pelas empresas aéreas – as empresas de fragrâncias tiveram poucas oportunidades de colocar seus talentos à prova. (A colaboração da Visa com a IFF em um cartão de crédito aromatizado a ser lançado é uma notável exceção.)
Isso poderia estar para mudar, uma vez que as evidências da poderosa relação entre o bulbo olfatório e o sistema límbico do cérebro, a parte que lida com memórias e emoções, parecem ser cada vez mais convincentes. Em 2007, o Raymond Poincaré Hospital, em Garches, França, em colaboração com a IFF e a organização sem fins lucrativos Cosmetic Executive Women, experimentou usar fragrâncias em pacientes que haviam sofrido traumas graves e perdido a memória ou até a fala. Um paciente, que havia perdido a capacidade de falar após um acidente de moto, murmurou suas primeiras palavras após ser sentir cheiro de alcatrão. (Depois de nove meses sem conseguir falar, sua primeira palavra foi “alcatrão”.) Outro paciente, após sair de 12 meses de coma, disse algumas palavras depois que os funcionários do hospital o fizeram sentir o cheiro de um pão que o havia marcado na infância.
Avanços na tecnologia de dispersão e na “coleta” de aromas, ou seja, na capacidade de desconstruir compostos aromáticos e recriá-los, permitem que os perfumistas atualmente possam produzir praticamente qualquer aroma. Como documentado no livro “Brand Sense”, de Martin Lindstrom, uma investigação da Rolls-Royce sobre queixas de clientes sobre a perda do senso de excelência nos carros de luxo apontou para o aroma como culpado. A montadora reagiu com um “projeto químico” para criar o cheiro do Silver Cloud 1965. “No total, foram encontrados 800 elementos separados”, escreve Lindstrom, incluindo gasolina, o revestimento usado sob o carro e feltro. O cheiro agora é aplicado embaixo dos assentos de cada carro que sai da linha de produção. Em 2003, a Cadillac começou a colocar aromas no couro de seus bancos. Chamaram a essência de Nuance.
Embora os moradores do Sister Thomas pareçam ser camundongos de laboratório para um segmento em expansão, Carter vê a aromatização como ferramenta para remodelar ambientalmente o centro das cidades americanas. Jovanovic pode ter resumido melhor, enquanto pulverizava o L ‘ Eau Vert du Bronx du Sur em um banheiro coletivo: “É um impacto no comportamento na esfera social!”
Fonte: Valor